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Os seguintes termos de pesquisa foram destacados:  interdisciplinaridade  américo  sommerman 

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Resumo
O artigo focaliza o processo de constituição deum cor-
po de conhecimento recente sobre a transdisciplina-
ridade. Baseia-se em fontes documentais de congres-
sos e colóquios internacionais sobre o tema e apre-
senta tal processo como parte do amplo movimento
de crítica , na atualidade, ao paradigma dominante
que preside a ciência moderna, considerado fragmen-
tador e redutor da realidade , porque centrado em dis-
ciplinas cujo pressuposto é ignorar o que existe “en-
tre” e “além” de suas fronteiras. Discute as possibilida-
des do surgimento desse novoreferencial relacionadas
ao poder heurístico do termo ‘transdisciplinaridade’,
considerado capaz de congregar cientistas de diferen-
tes áreas e humanistas em geral em torno de um con-
junto de idéias passível de representar a consecução
de um grande ideal: integrar o conhecimento e huma-
nizar a ciência. Essa proposta é considerada inovado-
ra, por não colocar a transdisciplinaridade como uma
hiperdisciplina, mas considera-la, ao lado da pluri, da
inter e também da disciplina, como uma das quatro
flexas deum mesmo arco: o doconhecimento. Também
por propor o diálogo entre as ciências, assim como
com a filosofia, a arte, a literatura, a experiência hu-
mana, etc. Destaca, igualmente, a capacidade heurís-
tica desse referencial, organizado sobre três pilares -
“ a complexidade”, “ os diferentes níveis de realidade”
e “ a lógica do terceiro incluído” – , por possibilitar
avanços em estudos que o tem empregado objetivando
a construção de uma metodologia transdisciplinar.
Aponta, finalmente, para a contribuição que a adoção
Augusta Thereza de Alvarenga
Socióloga, Doutora em Saúde Pública; Professora da Faculdade
de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
E-mail: atal@usp.br
Américo Sommerman
Mestre em Ciências da Educação pela Universidade de Lisboa,
Portugal; Doutorando em Ciências da Educação na Universida-
de François Rabelais de Tours, França; Coordenador Adjunto de
publicação do Centro de Educação Transdisciplinar – CETRANS.
E-mail: americo@cetrans.com.br
Aparecida Magali de Souza Alvarez
Psicóloga, Doutora em Saúde Pública; Pós-doutoranda da Facul-
dade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, pela FAPESP.
E-mail: apmagali@terra.com.br
Congressos Internacionais sobre
Transdisciplinaridade: reflexões sobre
emergências e convergências de idéias e ideais
na direção de uma nova ciência moderna
International Congresses on Transdisciplinarity: reflections on
emergences and convergences of ideas and ideals towards a
new modern science
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Introdução
Ao indagar seo avanço dos conhecimentos científicos
– que aumentaram em trinta anos mais do que se fez
durante o último milênio – beneficiou a humanidade,
Patrick Paul (2003) coloca-nos diante da questão cen-
tral que tem mobilizado a reflexão filosófica crítica,
representado por renomados pensadores como Jürgen
Habermas, Cornelius Castoriadis, Boaventura de Sou-
sa Santos, Edgard Morin, para citar alguns, sobre o
sentido,significado, objetivos, finalidades, valores, da
produção gerada pela ciência moderna fundada em
uma estreita concepção de racionalidade.
Paul aproxima-nos mais da discussão ao respon-
der “não”, citando como exemplos dois domínios que
a ele e a nós são familiares, a saúde e o meio ambiente.
Uma pequena incursão sobre a forma como a ciên-
cia moderna seconstitui, sefundamentae se organiza
permite, por um lado, melhor subsidiar o entendimen-
to da questão e resposta enunciadas por Paul e, por
outro,refletir sobre o significado assumido pelas pro-
postas da inter e da transdisciplinaridade como for-
mas de fazer avançar o conhecimento científico, nor-
teados por uma concepção de racionalidade mais am-
pla, que contempla homem e natureza como uma uni-
dade e não de maneira dissociada.
Focando a história da ciência, Kneller (1980, p.54)
afirma que “Aciência evolui através deatos dehomens
e mulheres – atos como inventar hipóteses, realizar
experimentos, ponderar provas e publicar resultados.
A finalidade desses atos é produzir um conhecimento
verificado – conhecimento que mereça aceitação pela
comunidadecientífica. Para produzir tal conhecimen-
to, a Ciência deve ser racional, pois, se as alegações
do conhecimento não forem racionalmente baseadas,
faltarão argumentos para que elas sejam preferidas à
pretensão de gurus e adivinhos, e a investigação cien-
tífica não terá qualquer significado. Portanto, se qui-
sermos entender o empreendimento científico deve-
mos apurar não só como a ciência evolui, mas também
até que ponto o faz racionalmente”.
Com essa asserção Kneller delineia o quadro onde
a produção da ciência moderna se inscreve tendo a
racionalidade como elemento definidor. E, segundo
Boaventura de Sousa Santos (1995, p.18), racionali-
dade que é, por sua vez, fundada na “consciência filo-
sófica da ciência moderna” que teve no racionalismo
desse referencial poderá trazer para pesquisas no
campo da saúde pública e coletiva.
Palavras-chave:Transdisciplinaridade; Interdiscipli-
naridade; Congressos; Paradigma; Ciência Moderna;
Saúde Pública
Abstract
The article approaches the process of constitution of
a recent body of knowledge about transdisciplinarity.
It is based on documental sources of international
congresses and colloquiums on the theme and pre-
sents this process as part of the current broad move-
ment of criticism against the dominant paradigm that
presides over modern science. This paradigm frag-
ments and reduces reality, because it is centered on
disciplines that ignore what exists “between” and
“beyond” their borders. It discusses the possibilities
of the emergence of this new body of knowledge rela-
ted to the heuristic power of the term ‘transdiscipli-
narity’, considered capable of congregating scientists
from different areas and humanists in general around
ideas that can represent the achievement of a great
ideal: integrating knowledge and humanizing science.
This proposal is innovative, as it does not consider
transdisciplinarity a hyperdiscipline; rather, together
with pluridisciplinarity, interdisciplinarity and also
the discipline, it is one of the arrows of the same bow:
thatof knowledge.Alsobecause itproposesthe dialog
between the sciences, and also with philosophy, the
arts, literature, human experience, etc. In addition, it
emphasizes the heuristic capacity of this body of
knowledge, organized on three pillars – “complexity”,
“different levels of reality” and “the logic of the inclu-
ded middle” –, as it enables advances in studies that
have been employing it, aiming at the construction of
a transdisciplinary methodology. Finally, it points to
the contribution that the adoption of this body of
knowledge can provide for research in the field of
public and collective health.
Keywords: Transdisciplinarity; Interdisciplinarity;
Congresses; Paradigm; Modern Science; Public
Health.
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cartesiano e no empirismo baconiano as suas primei-
ras formulações, que se condensam no positivismo
oitocentistaque concebe somentea existência deduas
formas deconhecimentocientífico,ou seja, as discipli-
nas formais da lógica e da matemática e as ciências
empíricas segundo o modelo mecanicista das ciênci-
as naturais.
Tal modelo de racionalidade que preside a ciência
moderna constitui-se, segundo Santos (1995), o para-
digma dominante, a partir do século XIX, quando além
do domínio nas ciências naturais se estende, igual-
mente, a parcela das ciências sociais emergentes.
Afirma, esse mesmo autor, que “a partir de então
pode falar-se de um modelo global de racionalidade
científica que admite variedade interna, mas que se
distingue e defende, por via de fronteiras ostensivas
e ostensivamentepoliciadas, deduas formas de conhe-
cimento não científico (e, portanto, irracional) poten-
cialmente perturbadoras e intrusas: o senso comum
e as chamadas ‘humanidades’ ou estudos humanistas
(em que seincluíram, entre outros, os estudos históri-
cos, filológicos, jurídicos, literários, filosóficos e teo-
lógicos” (Santos 1995,p.10). É assim que esse novomo-
delo global, considerado por Santos totalitário, passa
a negar o caráter racional a todas as formas de conhe-
cimento que não se pautaram pelos seus princípios
epistemológicos e pelas regras metodológicas conven-
cionais, por si só tomadas como garantia de critério
de verdade.
Com essa proposta que enclausura o processo de
conhecimento em compartimentos, a ciência moder-
na rompe radicalmente com a tradição do pensamen-
to clássico e enciclopedistadissociando saberes e prá-
ticas, indivíduo e sociedade, local e global, sujeito e
objeto, objetivo e subjetivo, passando a trabalhar, so-
bretudo, por temas e problemas circunscritos e espe-
cializados e a caracterizar-se por uma fragmentação
sempre crescente do saber, que encontra no isolado
espaço disciplinar seu principal sentido e finalidade,
o caráter científico.
Uma constatação alarmante dessa progressiva pul-
verização do saber disciplinar foram os dados apre-
sentados por J. Thompson Klein, em artigo de 1998,
citado por Paul (2003, p. 134), da explosão de especia-
lidades ocorridas na segunda metade do século pas-
sado. O referido autor assinala que, de 7 a 54 discipli-
nas identificadas de 1.300 a 1.950, pode constatar que
em 1987 havia 8.530 campos de conhecimento definí-
veis. E não se contabiliza aqui os domínios que ca-
racterizariam os conhecimentos outros que aqueles
da ciência.
Tal fatoencontra explicação nas grandes transfor-
mações políticas no período pós II Guerra Mundial
quando se observa a chamada “Guerra Fria” e a mar-
cante hegemonia econômica dos Estados Unidos da
América. Isto porque, neste contexto, a grande expan-
são da capacidade produtiva do sistema capitalista
passa a exigir cada vez mais o conhecimento especi-
alizado,o que levaigualmente à grande ampliação, em
nível mundial, do sistema educacional e da presença
de financiamentos público e privado para pesquisas
científicas e tecnológicas especialmente norteadas
pelos pressupostos de tal modelo hegemônico daciên-
cia. (Comissão Gulbenkian, 1996)
Vale mencionar que, nesse processo, a distinção
corrente entre as chamadas “duas culturas”, que con-
trapõem ciência e humanidades, se acentua se consi-
derarmos que, nesse período, as possibilidades de re-
cursos financeiros à pesquisa advindos dos Estados
Unidos e deoutros países desenvolvidos, mas também
de fundações (na sua maioria sediada nos Estados
Unidos), passam a incentivar uma ainda maior e mais
profunda cientificação das Ciências Sociais. Esse fato
passa a identificar a Sociologia, a Ciência Política e a
Economia como disciplinas marcadamente nomotéti-
cas por tomarem, em grande parte, o paradigma das
Ciências Naturais como modelo cientificamente legí-
timo, desenvolvido sob a bandeira da universalidade
da ciência. (Comissão Gulbenkian, 1996)
Pela adesão inconteste, acrítica e ideológica da
grande maioria de membros dacomunidadecientífica,
o referido modelo de ciência, conforme já observado,
firma-se como paradigma dominantea partir dosécu-
lo XIX (Santos, 1995), passa a gerenciar o que, na ter-
minologia de Kuhn (1978) poderíamos denominar de
“ciência normal” da modernidade, e, vale lembrar, he-
gemônica sobretudo por atender plenamenteaos inte-
resses da moderna sociedade industrial, tecnológica
e informacional que a sustenta e lhe atribui valores.
(Habermas, 1986)
Nessa linha de interpretação podemos entender,
como paradigma dominante, a definição que conside-
ramos mais corrente, dada pelo próprio Kuhn (1975,
p.13), que emprega esse termo na sua abordagem da
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história da ciência: “Considero paradigmas as expe-
riências científicas universalmentereconhecidas que,
durantealgum tempo, fornecem problemas e soluções
modelares para uma comunidade de praticantes [co-
munidade científica] de uma ciência.”
Paradigmas são, para esse autor, espécies de “mo-
delos” aceitos como dominantes por dadacomunidade
científica, cuja função é direcionar toda a pesquisa
em sua área. A idéia básica presenteé a deque é a “teo-
ria” dominante que determina os fatos que serão pro-
curados, investigados, e não o contrário. Portanto, os
problemas de investigação são sugeridos pelo paradig-
ma e por ele solucionados.
Nessa perspectiva, é a comunidadecientífica, com
base na“teoria” dominante, quem define que questões
podem ser legitimamente formuladas a respeito das
entidades existentes no mundo e que técnicas podem
ser empregadas na busca de solução.
Desse modo, para Kuhn (1975), antes da aceitação
de um paradigma tudo é mais complicado para uma
ciência porque há diversas teorias dirigidas à ativida-
de científica, como é o caso das Ciências Sociais. Daí
considerar estas últimas como pré-paradigmáticas.
Portanto, a idéia de adoção de paradigma relaciona-
se estreitamentecom a idéia de “maturidade”de deter-
minada ciência e de “pesquisa eficaz” porque fornece
respostas “seguras” e “coerentes” a dadas perguntas.
Como decorrência, todaprodução científica inscrita
no âmbitoda“ciência normal” freqüentementesuprime
novidades fundamentais por subverterem necessaria-
mente seus compromissos básicos, sobretudo a manu-
tenção do sucesso da “teoria”.Daí tais novidades serem
tratadas como “anomalias” e a ciência normal não se
colocar frente às novidades práticas ou teóricas.
Tais características paradigmáticas assumidas
pelomodelode ciência moderna encontram-se presen-
tes, com especificidades em diferentes áreas do conhe-
cimento, e ganham no campo dasaúde grande expres-
são, conforme demonstram vários trabalhos publica-
dos na área como, por exemplo, os de Naomar de
Almeida Filho ( 1989, 1992) e José Ricardo de Carva-
lho Mesquita Ayres (1994, 1995, 1997). Pelo fato deste
modelo ter assumido, segundo Santos (2004ª, p.18),
“a sua inserção no mundo mais profundamentedo que
qualquer outra forma de conhecimento anterior ou
contemporânea” é que podemos melhor entender a
natureza e relevância dodebateque setrava, em torno
da questão da racionalidade científica, notadamente
a partir dos anos 1960, acentuado nas últimas déca-
das do século passado e continuamente ampliado nos
dias de hoje.
Sobre a Emergência dos Pensamentos
Inter e Transdiciplinar e suas relações
Se retomarmos a resposta negativa de Patrick Paul
(2003), com a qual iniciamos o presente artigo, à sua
própria indagação, de se o grande avanço do conheci-
mento científico da modernidade beneficiou o “pro-
gresso” da humanidade, poderemos melhor entender
sua posição ao observarmos, por um lado, que sua re-
flexão se inscreve no interior do movimento conheci-
do como transdiciplinaridade, cujas raízes foram lan-
çadas pela preocupação primeira de incorporação, na
ciência moderna, do pensamento interdisciplinar,
como resposta à mencionada progressiva fragmenta-
ção e limites do saber disciplinar. Por outro, ao consi-
derarmos que esse pensamentointerdisciplinar, emer-
gente nos anos de 1960, centra-se na crítica ao positi-
vismo notadamente por esse desconsiderar qualquer
reflexão sobre o lugar que o homem ocupa no mundo
e no processo de conhecimento.
Na referência à gênese do movimento pela defesa
do pensamento interdisciplinar na ciência moderna,
não se pode ignorar o pensamento do filósofo francês
Georges Gusdorf,cujo nome é, segundo Siebeneichler
(1989), um dos mais citados nos textos contemporâ-
neos que abordam de maneira específica esse tipo de
pensamento. Considerado, por muitos, humanista ra-
dical, Gusdorf passa a defender em sua obra o projeto
da interdisciplinaridade como busca da totalidade do
conhecimento por considerar, segundo Minayo (1991,
p. 72), que a ciência moderna, pela fragmentação do
saber, ignora “o ser humano como ponto de partida e
de chegada”, “desnaturaliza a natureza” e “desumani-
za a humanidade” porque promove, segundo Japiassu
(1976) – que introduziu o pensamento desse autor no
Brasil – a ruptura entre o conhecimento da natureza e
do mundo social. Assim, para Gusdorf, em prefácio de
livro de Japiassu (1976), a grande perda de significa-
do para a humanidadedos produtos da ciência moder-
na – idéia que se aproxima ao pensamento de Patrick
Paul antes mencionado – encontra-se no fato de que,
ao romper radicalmente com a tradição dos pensa-
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mentos, clássico e enciclopedista, essa passa a des-
cartar qualquer tipo de inteligibilidade universal do
pensamento humano calcado em mitos e cosmogo-
nias, em nome de seu modelo característico de racio-
nalidade científica que reduz a percepção da realida-
de no processo de conhecimento.
Na crítica ao modelo positivista da ciência moder-
na – que marca a emergência da especialização do sa-
ber disciplinar e fragmentado – Gusdorf o contrapõe,
em seu trabalho intitulado “Passado,presente e futu-
ro da pesquisa interdisciplinar”, (Gusdorf, 1997), ao
caráter enciclopédico e caracteristicamente interdis-
ciplinar que marca toda a tradição grega – o enkuklio
paidéia –, programa milenar que avança até o Renas-
cimentopassando pela Idade Média, quando nasegun-
da metade do século XVIII é interrompido.
A despeito de tentativas para a reintrodução de
uma formação integral representada por uma “peda-
gogia da totalidade”, a proposta cientificista e positi-
vista que caracteriza o paradigma da ciência moder-
na se firma progressivamente, fazendo recuar a “es-
perança interdisciplinar”. (Gusdorf, 1977)
Segundo Sommerman (2003), embora frustrada,
a idéia não foi abandonada, mas somente as novas
condições históricas a partir da segunda metade do
século XX possibilitaram tal emergência.
Isto porque, no contexto das grandes transforma-
ções do pós II Guerra Mundial, pode-se observar, no-
tadamente a partir dos anos 1960, desenvolvimentos
notórios nas próprias estruturas do saber que vieram
por em causa, sobretudo, a realidade e validade da rei-
terada distinção entre “duas culturas”, ou seja, entre
ciências e humanidades, marca característica da ci-
ência moderna. (Comissão Golbenkian, 1996)
Nesse particular, fato a destacar é a incapacidade
demonstrada pelas teorias científicas mais tradicio-
nais para fornecer soluções plausíveis para as dificul-
dades encontradas pelos cientistas na abordagem de
problemas relacionados com fenômenos cada vez
mais complexos.
Considerados como conhecimentos de ponta da
ciência moderna, os avanços epistemológicos verifica-
dos nas áreas das ciências naturais e da matemática
tiveram grandes desdobramentos e propiciaram não
somente o aprofundamento, sob novas bases, da polê-
mica em torno da mencionada racionalidade cientí-
fica vigente, mas contribuíram igualmente para redu-
zir a rígida distinção entre as ciências naturais e as
ciências sociais como campos totalmente separados.
Assim, no caso das ciências naturais, tais avanços
no conhecimento dos fenômenos da natureza acentu-
aram a concepção de não linearidade, em detrimento
à de linearidade, a de complexidade, em detrimento à
de simplificação, além de constatar a impossibilida-
de de separar o medidor (no caso o sujeito do conheci-
mento) da medição (objeto de estudo). Até no caso de
algumas matemáticas, a superioridade da dimensão
interpretativa e qualitativa sobre a precisão quanti-
tativa de rigor mais limitado passou a ser reconheci-
da. (Comissão Golbenkian, 1996)
Na medida em que a diminuição das contradições
entre Ciências Sociais e Ciências Naturais não impli-
cou, segundo documento da Comissão Golbekian
(1996, p. 92), “conceber a humanidade como algo de
mecânico,mas antes o conceber a natureza como algo
de ativo e criativo”, tal fato passa a descortinar novos
espaços onde não somente a crítica ao modelo redu-
tor, positivista da ciência moderna tenha lugar, mas
igualmente ganhe expressão a colocação de propos-
tas alternativas à superação do referido modelo ou, o
que parece mais provável, a emergência de epistemo-
logias que possibilitem alargar a estreita concepção
de racionalidade da ciência moderna e sejam capazes
de articular o conhecimento existente, além de pro-
duzir novos.
Nessa perspectiva é que reflexões, como a empre-
endida por Gusdorf, ganha, nesse cenário pós anos
1960, grande expressão. A despeitodas críticas sofri-
das, o pensamento desse autor passa a ser conside-
rado referência para a discussão da interdisciplina-
ridade pela força heurística presente no reiterado
discurso acerca do lugar que o homem deve ocupar
na ciência.
Nesse sentido, vale destacar que dentro dos pres-
supostos da ciência moderna somente o projeto de
uma Enciclopédia de Ciência Unificada em moldes
reducionista à linguagem lógico-matemática, como a
apresentada por filósofos do Circulo de Viena na dé-
cada dos anos 1920 – como Otto Neurath, Rudolf Car-
nap, Charles Morris – poderia emergir, dada sua pro-
posta de pensar uma “unidade da ciência” fundada de
maneira exclusiva na linguagem da física, considera-
da a matriz cientifica por excelência à qual todas as
demais linguagens deveriam ser reduzidas.
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As dificuldades presentes para a elaboração de
uma proposta alternativa de síntese àquela preconi-
zada pelo Círculo de Viena, acima mencionada, a par-
tir do modelo de racionalidade que preside a chama-
da “ciência normal” (Kuhn, 1975) típica do mundo
moderno, residem nos próprios limites do modelo e
podem ser apreendidas, em linhas gerais, a partir da
descrição que Morin faz de como o mesmo – que deno-
mina paradigma da simplificação – opera pela frag-
mentação e redução do objeto de estudo no processo
de construção do conhecimento científico. Com tal
descrição, Morin pode demonstrar-nos, ainda, como
fenômenos complexos com que nos deparamos, como
é o caso da saúde, não podem ser analisados a partir
de tal modelo fragmentador e redutor.
Para Morin (1983, p. 31) o paradigma da simplifi-
cação característico da ciência moderna “determina
um tipo de pensamento que separa o objeto de seu
meio, separa o físico do biológico, separa o biológico
do humano, separa as categorias, as disciplinas, etc.
A alternativa à disjunção é a redução: estetipo depen-
samento reduz o humano ao biológico, reduz o bioló-
gico ao físico-químico, reduz o complexo ao simples,
unifica o diverso. Por isso, as operações comandadas
por este paradigma são principalmente disjuntivas,
principalmenteredutoras e fundamentalmente unidi-
mensionais. Se, se obedece apenas ao princípio de
disjunção, chega-se a um puro catálogo de elementos
não ligados; se, se obedece ao princípio de redução,
chega-se a uma unificação abstrata que anula a diver-
sidade. Por outras palavras, o paradigma da simplifi-
cação não permite pensar a unidade na diversidade
ou a diversidade na unidade, a imitas multiplex, só
permite ver unidades abstratas ou diversidades tam-
bém abstratas, porque não coordenadas”.
Muito embora a questão dos limites colocados pe-
las fronteiras do conhecimento disciplinar possa ser
resolvida, muitas vezes, conforme assinala Sommer-
man (2003), nos limites do próprio paradigma da ci-
ência moderna com a criação de verdadeiras novas
disciplinas - diríamos de interfaces – como é o casoda
bioquímica, da biofísica, dentre outras, o que preten-
demos aqui destacar, com a menção ao pensamento
de Gusdorf, é que a interdisciplinaridade por ele pre-
conizada difere deste tipo de solução. Isso, pela sua
proposta pressupor uma outra perspectiva epistemo-
lógica e ontológica para a geração do conhecimento
científico, o que a inscreve , conforme já observamos,
na ampla polêmica que passa a se travar não só em re-
lação à crítica ao paradigma simplificador, fragmen-
tador e redutor da realidade, característico da ciência
moderna, mas à busca de superação ou ampliação do
mesmo, sendo a interdisciplinaridade uma estratégia.
Daí, segundo Siebeneichler (1989, p.160), o primei-
roponto básico a transparecer da propostade interdis-
ciplinaridade de Gusdorf ser a “atitude decidida em
prol de umaracionalidade traçada em dimensões mais
amplas do que as da matemática, englobando não so-
mente o rigor e a exatidão científica, mas também as
significações do mundo vivido, que superam o âmbi-
to do friccionável e do mensurável”.
Acrescenta ainda Siebeneichler que, por isso,
Gusdorf “se opõe ao enciclopedismo do Círculo de Vi-
ena, o qual consegue, no seu entender, constituir re-
almente o universo unitário do discurso, mas somen-
te ao preço da renuncia a todas as significações vivi-
das, características do espaço vital existencial. Tal
visão interdisciplinar não é admissível, segundo ele,
porque celebra apenas os triunfos da inteligibilidade
lógico-matemática, que é sempre formal e vazia. Ou
seja: o universo aberto pelo tratamento matemático
simplesmente é evacuado de tudo aquilo que pode dar
um sentido às vidas reais dos seres humanos.” (Siebe-
neichler, 1989, p. 160)
Neste tipo de crítica, o que é importante reter do
pensamento de Gusdorf (1977) é a idéia, por um lado,
de que “é absurdo e vão pretender constituir uma Ci-
ência do Homem seessa ciência não encontra na exis-
tência humana seu ponto de partida e seu ponto de
chegada” (p. 646). Por outro, de que a interdisciplina-
ridade assim abstraída, não somente “se encontra...
localizada em nível da comunidade das formas, da
analogia das expressões” (Gusdorf, 1977:639), mas
também é apresentada como atividade reservada “a
alguns iniciados e seus raros discípulos, amadores da
especulação pura...”. (p. 646)
Paraesse autor,a interdisciplinaridade deveinscre-
ver-se na prática científica “evocando um horizonte
global, mas não totalitário, do conhecimentouniversal”
(p. 647). Deve responder “à exigência de um conheci-
mento mútuo do homem, sob a forma de um humanis-
mo da pluralidade e da convergência”. (p. 647).
Entende, assim, Gusdorf, que o conhecimento in-
terdisciplinar deve ser acolhido no interior de cada
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ciência, se constituir numaverdadeira “lógica da des-
coberta”, consistir de uma abertura recíproca entre
pesquisadores, uma comunicação entre os domínios
do saber, uma fecundação mútuae não um formalismo
que neutralize “todas as significações fechando todas
as suas saídas” (p. 643). Acredita que com essa atitude
interdisciplinar o pesquisador possa se libertar de
uma forma de inteligibilidade que o circunscreve a
determinadas possibilidades de conhecimento, na
qual “ sua reflexão se estenda pelas corrediças cuida-
dosamentelubrificadas de uma redepré-fabricada”(p.
643). Em suma, que incorpore um pensamento inter-
disciplinar onde o código dos procedimentos lógico-
matemáticos perca seu prestígio e a interdição do
princípio da contradição cesse de prevalecer.
O tema da interdisciplinaridade versa sobre” um
conhecimento dos limites ou de um conhecimento aos
limites, instituindo entre os diversos ocupantes do es-
paço mental um regime de co-propriedade, que funda
a possibilidade de um diálogo entre os interessados.
Essa noção nada mais faz que retomar a idéia do
universitasscientiarum, constitutivadauniversidade
tradicional”. (Gusdorf, 1977, p. 635)
A idéia presente é a de que cabe ao próprio pesqui-
sador – diríamos novo pesquisador imbuído de uma
atitude interdisciplinar – aproximar-se das bordas
disciplinares e identificar que entre as fronteiras dis-
ciplinares não existe “um espaço vazio” como, segun-
do Kuhn (1987, p. 340), pressupõe o paradigma da
moderna ciência disciplinar, e, vale lembrarmos , em
nome da garantia de uma convencionada cientifi-
cidade.Cabe, assim, ao novopesquisador descobrir as
interrelações possíveis existentes entre disciplinas
próximas e disciplinas mais distantes, tendo em vista
instituir práticas interdisciplinares – que signifiquem
um chamado à ordem do humano – e alarguem o pro-
cesso de conhecimento, nas diferentes áreas do saber.
Para tanto se apresenta como fundamental a incorpo-
ração do pensamento interdisciplinar, o que implica
para o pesquisador repensar sua própria formação cien-
tífica e, para a universidade, a responsabilidade uma
novaperspectivade ensino onde a interdisciplinaridade
encontre espaço a partir de uma pedagogia que contem-
ple a totalidade do conhecimento articulado.
Se as possibilidades deemergência dopensamento
transdisciplinar, nas últimas décadas do século XX,
como novo espaço do conhecimento, se beneficiam
com a discussão da interdisciplinaridade que o prece-
de, isso também ocorre devido ao avanço teórico rea-
lizado por pesquisadores, nos diferentes campos do
saber, igualmente preocupados com a fragmentação
do conhecimento.
Vale observar, no entanto, a cautela com que essa
idéia é recebida por autores como Gusdorf, conforme
seu discurso abaixo descrito. Nele podemos notar sua
preocupação pelo risco que essa noção poderia repre-
sentar à instauração de uma hiperdisciplina, a exem-
plo dos ideais do Círculo de Viena, amplamente cri-
ticados por ele, conforme discutimos anteriormente:
“Mais nova, mais fascinante, ao menos na ordem lin-
güística, é a noção de transdisciplinaridade; ela enun-
cia a idéia de uma instância científica capaz de im-
por sua autoridade às disciplinas particulares. Ela
designa talvez um espaço de convergência, uma pers-
pectiva de olhar que juntaria ao horizonte do saber,
conforme uma dimensão horizontal ou vertical, as
intenções e preocupações das diversas epistemolo-
gias. Pode setratar deuma metalinguagem ou de uma
metaciência mas, na estratégia do saber, a ordem
transdisciplinar define uma posição chave, da qual
sonharão se apropriar todos aqueles que são atormen-
tados pelas ambições do imperialismo intelectual. O
matemático está inclinado a pensar que a matemáti-
ca é a ciência das ciências; o historiador reclama a
mesma prerrogativa para sua própria disciplina, no
entanto outros podem renvindicar essa prioridade
para o conhecimento biológico (para a história natu-
ral, a biologia, a psicologia, a medicina). A transdisci-
plinaridade tal como é praticada é uma poltrona va-
zia, na qual todos ambicionam se sentar. Ela corres-
ponde a um dos principais desafios da feira de vaida-
des intelectuais”. (Gusdorf, 1977, p. 635-636)
No entanto, embora esse tipo de preocupação de
Gusdorf seja pertinente, historicamente essa idéia
emergente de transdisciplinaridade não se afastará
do nível de crítica aos limites do conhecimento disci-
plinar, por ele realizado, em defesa da interdiscipli-
naridade.Assim, nesse cenário das primeiras décadas
da segunda metade do século XX, podemos observar
relatos, em fontes documentais, sobre a tendência a
se buscar identificar as especificidades, complemen-
taridade e interrelações existentes entre transdisci-
plinaridade e interdisciplinaridade, assim como em
relação à multidiciplinaridade e pluridisciplinari-
Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005 15

Page 8
dade, tendo como contrapontoo tipo de conhecimento
unidisciplinar, fragmentador e redutor, típico da
“ciência normal” da modernidade.
Tal fato pode ser explicado porque, ao lado do tipo
de discussão empreendida por Gusdorf sobre a inter-
disciplinaridade, avanços teóricos e metodológicos
ampliam as condições para a emergência do pensa-
mento transdisciplinar, sob novas perspectivas, com
base em pesquisas desenvolvidas por investigadores
como ClaudeLevi-Strauss, Jean Piaget, Edgard Morin,
Cornelius Castoriadis, Miklas Luhmann, Ilya Prigo-
gine , Humberto Maturana, Francisco Varela, Henri
Atlan, Jurgen Habermas, dentre outros.
É a partir de obras como as desses autores que se
pode falar hoje em dia, segundo Ciurana (2003, p. 58),
em “conceitos transdisciplinares, como o são aqueles
conceitos sugeridos desaberes bem poucolocalizáveis
se tivermos o sentido de que estes não são saberes
facilmente apresáveis e redutíveis a simples discipli-
nas: a teoria de sistemas; a teoria da auto-organiza-
ção; a cibernética; certas partes da termodinâmica
(sobretudo da termodinâmica prigoginiana): a teoria
da informação; conceitos da lingüística saussureana
como o conceito de código, mensagem, etc.”
Apontando para a importância daemergência des-
se tipo pensamento no mundo moderno, mas igual-
mente para os riscos – a exemplo da precupação de
Gusdorf já mencionada – e desafios epistemológicos
que seu tratamento encerra, Ciurana afirma que “o
transdisciplinar é hoje um problema e uma necessi-
dade. O problema é como fazer o transdisciplinar sem
totalizar ou homogeneizar. Isto é, como mostrar que
o transdisciplinar não nos leva, se temos o sentido da
complexidade, a nenhum tipo de unidade ou metau-
nidade rígida ou imóvel” (Ciurana, 2003, p. 57)
A partir de tal colocação esse autor apresenta al-
guns pressupostos básicos do pensamento transdis-
ciplinar que advoga, ou seja: “a perspectiva de traba-
lho transdisciplinar implica a necessidade da adoção
do pensar dialógico, porque a unificação transdis-
ciplinar pressupõe operar na interação e na tensão.
Nesse sentido, não se trata de homogeneizar o dife-
rente, mas assumir a diferença e fazer essa diferença
dialogar. (p. 57)
Isto porque “pensar de forma dialógica [no senti-
do empregado por Edgard Morin] é estar subordinado
aos imperativos de outro paradigma. É fazer dialogar
num mesmo espaço intelectual o complementar, o
concorrente, o antagônico. É intercomunicar lógicas
diferentes na ocasião de explicar fenômenos comple-
xos.” (Ciurana, 2003, p. 48)
Com essas considerações Ciurana aponta para al-
guns pressupostos que permitem identificar uma
dada perspectiva teórico-metodológica do pensar
transdisciplinar e coloca no tratamento dos fenôme-
nos complexos, em sua dinâmica, o objetivo central
da abordagem transdisciplinar.
Assim, se o objeto encontra-se em movimento,
igualmente em movimento deve colocar-se o pensa-
mento do sujeito no processo de conhecimento. A
transdisciplinaridade não pode ser vista fora de uma
relação dialógica entre sujeito-objeto. Portanto, re-
quer um métodoele também transdisciplinar e neces-
sariamente dialógico.
Tal exigência de um método dialógico prende-se
ao fato de que na abordagem transdisciplinar o desa-
fio presente é o de estabelecer inter-relações das di-
versas complexidades, dos diferentes níveis de reali-
dade e contextos. Igualmente, o de fazer emergir no-
vas figuras de saber ou um metasaber por relação aos
saberes particulares, disciplinares.
Nesse propósito, Ciurana (2003) entende que “as
novas perspectivas sistêmicas que tenham o sentido da
impossibilidade do fechamento num grande sistema”
são as que oferecem melhores aportes, ou condições,
porque surgem da “organização”. Isto por considerar
que “organizar é dispor as distintas disciplinas em
interações que, em sua complementaridade e também
antagonismo, façam surgir um saber diferente, desde
o ponto de vista qualitativo. Gerar um saber que ao or-
ganizar a diferença, sem anulá-la possa permitir, a par-
tir desta última, criar uma novaperspectivadaqual pos-
samos contemplar texto e contexto” (p. 60-61).
Nessa perspectiva, a transdisciplinaridade não
nega o disciplinar uma vez que parte do disciplinar,
mas o relativiza, constituindo-se num saber que or-
ganiza diferentes saberes necessita e propõe o encon-
tro entre o teórico e o prático, entre o filosófico e o
científico,apresentando-se,assim, como um saber que
é da ordem do saber complexo.
A partir de tais concepções é possível considerar
que a busca dos fundamentos para uma abordagem
transdisciplinar passe, necessariamente, pelo reco-
nhecimento de que o eixo da ciência contemporânea
16 Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005

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seja, de acordo com Morin (1996), o da complexidade.
Na medida em que os desafios para a investigação de
fenômenos complexos remetem a questão dos funda-
mentos dos processos de conhecimento para as esfe-
ras ontológica, epistemológica e lógica, é nosso pro-
pósito,no presentetexto,procurar descrever e refletir
como, no espaço de congressos e reuniões internacio-
nais, historicamentevai se delineando e seconstituin-
do, a partir de consensos sucessivos e progressivos,
um corpo de conhecimentos acerca da transdiscipli-
naridade, fundamentado a partir da definição do que
passa a ser caracterizado como pilares da transdisci-
plinaridade, considerados essenciais para a constru-
ção de uma metodologia transdisciplinar. Nossa con-
cepção básica é a de que tal corpo de conhecimentos se
constitui especialmente pela heurística desse termo
possibilitar,nesses encontros internacionais, emergên-
cias e convergências de idéias na direção de um novo
modo de pensar a ciência , capaz de congregar os ideais
decientistas dediferentes áreas, filósofos, humanistas,
teólogos, artistas, poetas, no sentido da busca de supe-
ração dos limites impostos ao conhecimento pelopara-
digma simplificado da ciência moderna.
O Caminho do Pensamento
Transdisciplinar no Contexto de
Congressos Internacionais
Sobre a emergência do conceito de transdisci-
plinaridade
Se o impulso dado ao avanço do pensamento interdis-
ciplinar (na ciência e na educação) teve, segundo
Santomé (1998), como um dos momentos marcantes
o I Seminário internacional sobre pluri e interdiscipli-
naridade, realizado na Universidade de Nice (França),
de 7 a 12 de setembro de 1970, ele marca igualmente o
momento de surgimento do termo ‘transdiciplinari-
dade’ que passará, juntamente com o de interdiscipli-
naridade, a representar um novo horizonte de possi-
bilidades à superação dos limites do conhecimento
centrado, de maneira exclusiva, no unidisciplinar. A
expressão que ganhou esse seminário reside não so-
mentenoseuobjetivo,queeraodeaprofundaroscon-
ceitos de pluri e interdisciplinaridade, assim como
analisar sua adequação no desenvolvimentodo conhe-
cimento e da sociedade da época, mas também na im-
portância das instituições envolvidas. Organizado pe-
lo Centro de Pesquisa e Inovação do Ensino (CERI),
foi patrocinado pelo Ministério daEducação daFrança
e pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvi-
mento Econômico (OCDE). Sua relevância se manifes-
ta igualmente no número de participantes, que repre-
sentavam vinte e um paises e eram, ainda segundo
Santomé, na grande maioria adeptos das perspecti-
vas sistêmicas e estruturalistas.
Segundo Nicolescu (2005), nesse Seminário
1
a pa-
lavra ‘transdisciplinaridade’ aparece nas falas deJean
Piaget, Erich Jantsch e André Lichnerowic. Afirma
igualmenteque é atribuída à Piaget, em sua comunica-
ção, a referência à proposta de uma primeira descri-
ção, (ou definição, para outros autores) do significa-
do da palavra transdiciplinaridade. A proposta é as-
sim transcrita por Sommerman (2003, p. 100) “... à
etapa das relações interdisciplinares, podemos espe-
rar ver sucedê-la uma etapa superior que seria ‘trans-
disciplinar’, que não se contentaria em encontrar
interações ou reciprocidades entre pesquisas especia-
lizadas, mas situaria essas ligações no interior de um
sistema total, sem fronteira estável entre essas disci-
plinas.” Segundo Sommerman, foi essa definição que
serviudebase para a que foi adotada pelaconferência.
Embora na discussão de Piaget possa estar presen-
te a idéia de que a emergência do transdiciplinar su-
peraria o interdisciplinar, o que se observa, nos des-
dobramentos futuros, é um movimento diferente.
Isso ocorre, segundo Sommerman (2003), como
resultado do amplo processo de discussão travado em
várias reuniões e congressos internacionais relativos
ao tema, notadamente a partir da segunda metade da
década de 1980. Nos vários documentos oficiais, a
idéia básica presente é a de que a inter e a transdisci-
plinaridade,estreitamenterelacionadas, não excluem
e não excluirá, no novo processo de desenvolvimento
1 No artigo de Nicolescu (2005), o referido seminário internacional é intitulado “Interdisciplinaridade – Problemas de Ensino e Pesqui-
sa em Universidades”.
Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005 17

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daciência, uma à outra, e,nem ambas, excluirão a dis-
ciplinaridade, a multi e a pluridisciplinaridade. Isto
porque, estas, no seu conjunto, representam diferen-
tes graus de possibilidades de tratamento da realida-
de, tendo em vista o reconhecimento da existência de
seus diferentes níveis. Serão, na linguagem de Basa-
rab Nicolescu ( 2001, p. 53), “flechas do mesmo arco
do conhecimento”.
Muito embora Santomé (1998) assinale que pouco
avanço tenha ocorrido, em relação ao objetivo de
aprofundamento da discussão e das definições sobre
a pluri e a inderdisciplinaridade, no referido seminá-
rio, o que se pode observar é que tal encontro passou
a representar um marco para a ampliação da discus-
são, em nível internacional, dos pensamentos inter e
transdisciplinar. Muito embora considerados relaci-
onados puderam, ao que parece, manter certa identi-
dade, com reflexões específicas.
As possibilidades de ampliação dessa discussão
devem-se, em grande parte, segundo Santomé (1998),
à firme constatação de que a crescente complexidade
dos problemas enfrentados pelas sociedades moder-
nas, assim como a grande velocidade das mudanças
passaram a exigir “políticas científicas” capazes de
fomentar o trabalho e a pesquisa interdisciplinar. Isso
porque, tal constatação fez com que, a partir de en-
tão, a UNESCO e a OCDE passassem a apoiar e a pro-
mover debates, seminários e colóquios de caráter in-
ternacional que divulgaram cada vez mais a pluri, a
inter e a transdisciplinaridade como novas possibili-
dades de fazer ciência e promover um ensino que con-
templasse as humanidades na ciência.
Nesse contexto, vale destacar a constatação de
Nicolescu (2005) sobre a contribuição da proposta de
um pensamento transdiciplinar, trazida por Jean
Piaget, no referido seminário. Para esse autor, a des-
crição de transdisciplinaridade, embora vaga, teve o
mérito de apontar um novo espaço de conhecimento
sem fronteiras estáveis, fixas, entre as disciplinas. Tal
fato assinalado por Nicolescu parece-nos relevante
porque, a partir de então, na tendência às caracteri-
zações e definições dos conceitos multi, pluri e inter-
disciplinar, embora se mantenha como referência bá-
sica o (uni)disciplinar, autores passaram igualmente
a considerar o (trans)disciplinar e as possíveis medi-
ações entre esses diferentes níveis de abordagem do
conhecimento.
A despeito de a literatura especializada registrar
uma gama variada de classificações (Sommerman,
2003), matriz clássica da diferenciação entre esses ní-
veis ainda permanece a proposta de Erich Jantsch, di-
vulgada pela publicação temática da OCDE/CERI, em
1972, com as principais contribuições do referido semi-
nário sobre interdisciplinaridade, de 1970, cuja relação
completa de autores pode ser observada no livro de
Japiassu (1976, p 220), em sua “Bibliografia Sumária”.
Nessa proposta, Jantsch procura não somentedes-
tacar, em linhas gerais, no que consiste a multi, a
pluri, a inter e a transdiciplinaridade mas, igualmen-
te, caracterizar o tipo de sistema, relacionado ao nível
de simplicidade ou de complexidade a que pertencem,
apresentando suas respectivas configurações, em fun-
ção dos níveis que representam. Esse modelo de clas-
sificação, bastante divulgado pela literatura especi-
alizada, encontra-se em detalhes em obra de Japiassu
(1976, p 73- 74), sendo discutido e ampliado em artigo
de Almeida Filho (1997). O importante a sinalizar em
relação a essa e outras propostas similares é que, em
linhas gerais, dada a perspectiva sistêmica adotada
pelo autor e a consideração dos objetos complexos, os
conceitos demulti, pluri, inter e transdisciplinaridade
são caracterizados a partir dos graus sucessivos de
cooperação e de coordenação crescente de disciplinas
que possam apresentar, estando tal coordenação pre-
vista somente nos casos de inter e de transdisci-
plinaridade, sendo, nas duas primeiras, consideradas
tão somente o grau de cooperação teórico-metodoló-
gica existente.
É, assim, nesse cenário onde se apresentam múl-
tiplas possibilidades de gerar diferentes conhecimen-
tos e promover diferentes formações, muito além do
modelo unidisciplinar, típico daciência moderna, que
eventos internacionais, a maioria promovida pela
UNESCO, ampliaram os espaços de discussão e de
interlocução sobre a idéia de transdisciplinaridade
possibilitando, segundo Sommerman (2003), uma
definição cada vez mais clara desse conceito e de sua
fundamentação.
Marcantes, nesse sentido, foram: o colóquio sobre
“Aciência diantedas fronteiras doconhecimento”,em
1986; o Congresso “Ciência e Tradição: perspectivas
transdisciplinares para o século XXI”, em 1991; o “I
Congresso Mundial da Transdiciplinaridade”, em
1994; o Congresso Internacional de Transdiscipli-
18 Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005

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naridade “Que Universidade para amanhã? Em busca
de uma evolução transdisciplinar da Universidade”,
em 1997; e, finalmente, o “II Congresso Mundial da
Transdisciplinaridade”, em 2005, todos eles organiza-
dos pela UNESCO ou apoiados por essa instituição.
O desenvolvimento do conceito de transdiscipli-
naridade em congressos internacionais
A ampla discussão que se trava sobre as ciências nas
últimas décadas do século XX acentua a crítica da ci-
ência enquanto única modalidade válida de apreen-
são do real. Nesse sentido, a reivindicação da plurali-
dade de modalidades de apreensão do real vai de par
com a crítica do dualismo sujeito/objeto impregnado
na modernidade ocidental muito para além da ciên-
cia. Tal tipo de colocação, que Boaventura de Souza
Santos identifica na discussão que Carlos Plastino e
Hugo Zemelman fazem, de tal dualismo e dos limites
da estreita concepção de racionalidade que preside a
ciência moderna, é parte da ampla discussão que vá-
rios outros autores, pertencentes a diferentes campos
e áreas de conhecimento, realizam na ampla coletâ-
nea coordenada por esse autor (Santos, 2004), a qual
revisita sua obra publicada em 1980, intitulada “Um
Discurso sobre as Ciências” (Santos, 1995), cujas idéi-
as foram apresentadas no início desse trabalho para
caracterizar o referido paradigma.
A importância da mesma consiste na demonstra-
ção, pelos vários autores, e também por Santos, da per-
tinência de suas colocações na obrade 1980e de como
tal discussão vem se apresentando e seaprofundando
não somente no campo das Ciências Sociais, mas
igualmente nas áreas da Física e da Biologia, o que
explica a busca de criação de novos conceitos, novas
teorias, como o avanço da reflexão em torno das con-
cepções de complexidade, de sistema, de auto-organi-
zação, de cibernética, dentre outras, que, conforme já
mencionamos, abrem perspectivas para a emergência
e aprofundamento do pensamento interdisciplinar,
assim como do pensamento transdiciplinar.
Nesse contexto de efervescência intelectual, os
referidos encontros, como colóquios e congressos in-
ternacionais, permitem identificar, a partir de 1986,
algumas das características que apontam para o avan-
ço do pensamento transdisciplinar secundados por
esses novos conceitos e novas teorias.
Embora, se considere que a “história oficial da
Transdisciplinaridade” comece de fato no colóquio de
Veneza, ocorrido em 1986, na análise dos documen-
tos gerados pelos vários encontros ganha destaque,
primeiramente, o congresso “Ciência e Tradição: pers-
pectivas transdisciplinares para o século XXI”, em
1991, no qual foram explicitados os fundamentos teó-
ricos e epistemológicos norteadores das reflexões so-
bre transdisciplinaridade nos congressos posteriores.
No entanto, consideramos importante mencionar
que a relevância do documento final desse colóquio,
intitulado “Declaração de Veneza”
2
, encontra-se não
somente no registro da posição critica ao paradigma
simplificado e reducionista da ciência moderna, mas
sobretudo à importância deseus signatários, represen-
tantes de renome internacional, de diferentes áreas do
saber – ciências e humanidades – representando dife-
rentes países. Nessa Declaração, esses explicitam a re-
cusa a qualquer “projeto globalizante”, a qualquer “sis-
temafechado de pensamento” e reconhecem, ao mesmo
tempo, a “urgência de uma procura verdadeiramente
transdisciplinar, de uma troca dinâmica entre as ciên-
cias ‘exatas’ e as ciências ‘humanas’, a arte e a tradi-
ção”. Apontam, assim, para a negação da ruptura exis-
tente entre ciência e humanidades, que passam a ser
caracterizadas como “duas culturas”, assim como à se-
paração operada na ciência entre homem e natureza.
A seguir,apresentamos um balanço das principais
idéias trazidas pelos documentos finais gerados no
congresso “Ciência e Tradição”, de 1991, e em outros
eventos similares, que passam a conformar um corpo
deidéias sobre a transdisciplinaridade,no interior do
qual ganha expressão a definição de determinados
pressupostos considerados fundamentais para a cons-
trução de uma metodologia transdisciplinar.
O documento final desse congresso, intitulado
Ciência e Tradição, aponta para o lugar onde se ins-
creverão as reflexões sobre transdisciplinaridade,
nesses eventos, ao fazer referência às revoluções
conceituais que ocorreram na ciência no início do sé-
2 Este documento encontra-se, na íntegra, como Anexo 1, sob o título “ Declaração de Veneza”, em coletânea organizada por Sommerman
e cols (2002, p.187-190).
Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005 19

Page 12
culo XX e que geraram rupturas epistemológicas im-
portantes capazes de permitir um novo diálogo entre
a ciência e a tradição e recompor a unidade da cultu-
ra, conforme pode ser observado no excerto, a seguir,
composto por alguns artigos do referido documento
3
:
“3.Uma das revoluções conceituais deste século veio,
paradoxalmente,daciência,maisparticularmente da
física quântica,que fez com que a antigavisão darea-
lidade,com seusconceitos clássicos dedeterminismo,
que ainda predominam no pensamento político e eco-
nômico,fosse explodida.Ela deu à luz a uma nova ló-
gica, correspondente, em muitos aspectos, a antigas
lógicas esquecidas.Um diálogo capital,cadavez mais
rigoroso e profundo, entre a ciência e a tradição pode
então ser estabelecido a fim de construir uma nova
abordagem científica e cultural: a transdisciplinari-
dade.4.A transdisciplinaridade não procura construir
sincretismo algum entre a ciência e a tradição: a
metodologia da ciência moderna é radicalmente dife-
rente das práticas da tradição. A transdisciplinari-
dade procura pontos de vista a partir dos quais seja
possíveltorná-las interativas,procuraespaços depen-
samento que as façam sair de sua unidade,respeitan-
do as diferenças, apoiando-se especialmente numa
nova concepção da natureza. 5. Uma especialização
sempre crescente levou a uma separação entre a ciên-
cia e a cultura,separação que é a própria característi-
ca do que podemos chamar de “modernidade” e que
só fez concretizar a separação sujeito-objeto que se en-
contra na origem da ciência moderna. Reconhecendo
o valor daespecialização,a transdisciplinaridade pro-
cura ultrapassá-la recompondo a unidade da cultura
e encontrando o sentido inerente à vida.6.Por defini-
ção, não pode haver especialistas transdisciplinares,
mas apenas pesquisadores animados por uma atitu-
de transdisciplinar. Os pesquisadores transdiscipli-
nares imbuídos desse espíritosó podem se apoiar nas
diversas atividades da arte, da poesia, da filosofia,
do pensamento simbólico, da ciência e da tradição,
elas própriasinseridas em sua própria multiplicidade
e diversidade. Eles podem desaguar em novas liber-
dades do espírito graças a estudos trans-históricos
ou transreligiosos, graças a novos conceitos como
transnacionalidade ou novas práticastranspolíticas,
inaugurando uma educação e uma ecologia trans-
disciplinares. 7. O desafio da transdisciplinaridade é
gerar uma civilização, em escala planetária que, por
força do diálogo intercultural,se abra para a singula-
ridade de cada um e para a inteireza do ser.”
A partir de então, os demais congressos sobre
transdisciplinaridade passaram a ser organizados
pelo CIRET (Centro Internacional de Pesquisas e Es-
tudos Transdisciplinares), em colaboração com a
UNESCO e outras organizações. A importância desse
fato reside em que esse Centro, fundado por Basarab
Nicolescu no ano de 1987 e sediado em Paris, passou
a congregar vários membros – cientistas, filósofos e
humanistas de vários países – que passaram a consti-
tuir o que, numa aproximação à linguagem de Kuhn
(1975) poderíamos designar como comunidade depen-
sadores com “atitude transdisciplinar”. Dele, segun-
do Sommerman (2003), faziam parte, em 2003, 167
membros, representando vinte e quatro países, den-
tre os quais, além do próprio Nicolescu, pensadores
como EdgardMorin, Gilbert Durand,Michel Cazenave,
Geoffrey F. Chew, Nicolò Dallaporta, Giuseppe Del Re,
Patrick Paul, Gaston Pineau, Ubiratan DAmbrosio,
dentre outros.
Em 1994, o I Congresso Mundial da Transdisci-
plinaridade, realizado em Portugal e organizado pelo
CIRET, com a parceria da UNESCO, gerou um docu-
mento final intitulado Carta da Transdisciplina-
ridade
4
assinado por 62 participantes, de 14 países.
Pela análise do documento, podemos observar que al-
guns de seus artigos fornecem evidências quanto ao
avanço de alguns passos a mais na definição do refe-
rido conceito assim como das bases teórico-epistemo-
lógicas, fornecendo mais subsídios para a definição
de uma metodologia transdisciplinar. Mais uma vez
podemos observar o cuidado dos signatários desse e
demais documentos em explicitar o pressuposto bá-
sico que passa a nortear a busca por um pensamento
transdisciplinar nesses eventos, conforme reza o pri-
3 Este documento encontra-se, na íntegra, como Anexo 2, sob o título “Ciência e Tradição: Perspectivas Transdisciplinares para o Sécu-
lo XXI – Comunicado Final” , em coletânea organizada por Sommerman e cols (2002, p.191-192)
4 Este documento encontra-se, na íntegra, sob o mesmo título, como Anexo 3 da coletânea organizada por Sommerman e cols (2002,
p.193-197).
20 Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005

Page 13
meiro artigo dessa Carta: “Qualquer tentativa de re-
duzir o humano a uma meradefinição e de dissolvê-lo
nas estruturas, sejam elas quais forem, é incompatí-
vel com a visão transdisciplinar”, o que nos permite
considerar esses encontros internacionais como um
espaço de encontro não somente para a comunhão de
idéias acerca da construção do conhecimento, funda-
do em uma racionalidade mais ampla, mas sobretudo
para a comunhão de ideais acerca da natureza desse
conhecimento. Isso porque, em seu pressuposto bási-
co, acima descrito, ocupa papel nuclear a idéia já de-
fendida pelo próprio Gusdorf, da construção de uma
“Ciência do Homem .... que encontre na existência
humana seu pontode partida e seu pontode chegada”
(Gusdorf, 1997, p.646).
Quanto à definição do conceito, podemos destacar
os artigos 3, 5, 6 e 7 da referida Carta:
“Artigo 3: (...) A transdisciplinaridade não procura o
domínio sobre as várias outras disciplinas, mas a
abertura de todas elas àquilo que as atravessa e as
ultrapassa. (...) Artigo 5: A visão transdisciplinar é
resolutamente aberta na medida em que ela ultrapas-
sa o campo das ciências exatas devido ao seu diálogo
e sua reconciliação não somente com as ciências hu-
manas,mas também com a arte,a literatura,a poesia
e a experiência espiritual. Artigo 6: Com a relação à
interdisciplinaridade e à multidisciplinaridade, a
transdisciplinaridade é multirreferencial e multidi-
mensional.”
Os artigos, dessa Carta, que versam sobre a atitu-
de dopesquisador e doator transdisciplinar, apontam,
conforme abaixo descritos, para a importância de
aquisição pelo mesmo de uma nova visão de mundo
sinalizando como a questão da relação sujeito-objeto
no processo de conhecimento se contrapõe, em sua
concepção, à postura positivista, que norteia o para-
digma da ciência moderna:
“Artigo 9: A transdisciplinaridade conduz a uma ati-
tude aberta em relação aos mitos,às religiões e àque-
les que os respeitam num espírito transdisciplinar.
Artigo 10: Não existe um lugar cultural privilegiado
de onde se possam julgar as outras culturas. A abor-
dagem transdisciplinar é ela própria transcultural.
Artigo14: Rigor,aberturae tolerância são característi-
cas fundamentais da atitude e da visão transdisci-
plinar. O rigor na argumentação, que leva em conta
todos os dados, é a melhor barreira contra possíveis
desvios. A abertura comporta a aceitação do desco-
nhecido,do inesperado e do imprevisível.A tolerância
é o reconhecimento dodireito às idéias e verdades con-
trárias às nossas.”
Mas será no artigo 2 da Carta da Transdisciplina-
ridade que poderemos observar o grande avanço no
sentido de uma metodologia transdisciplinar, a par-
tir de alguns enunciados que se apresentam como fun-
damentais para um novo processo de conhecimento:
“O reconhecimento da existência de diferentes níveis
de realidade, regidos por lógicas e leis diferentes, é
inerente à atitude transdisciplinar”. Vemos, nesse
enunciado, emergirem dois dos três pilares metodo-
lógicos da pesquisa transdisciplinar atualmente con-
siderados – os diferentes níveis de realidade e as dife-
rentes lógicas – que foram explicitados no documen-
to do congresso realizado três anos mais tarde e, a
partir de então, passaram a integrar o núcleo desse
novo corpo de conhecimento que se configura.
Em 1997, organizado pelo CIRET, com a parceria
da UNESCO, ocorreu em Locarno (Suíça) o congresso
intitulado “QueUniversidade para o Amanhã? Em bus-
ca de uma evolução transdisciplinar daUniversidade”,
para o qual foi elaborado e apresentado um “documen-
to síntese”
5
, contendo como título o mesmo nome do
congresso, a partir dos resultados de amplo projeto
realizado em parceria, Projeto CIRET - UNESCO, cuja
primeira fase teve início em outubro de 1995 e contou
com a coordenação de Basarab Nicolescu, pelo CIRET,
e de Madeleine Gobeil, pela UNESCO. Pelo documen-
to, podemos observar o grande número de pesquisa-
dores envolvidos no referido projeto, pertencentes a
diferentes áreas do conhecimento e oriundos de dife-
rentes países, e constatar o cuidado com que esse con-
gresso foi preparado atestando sua relevância.
A importância desse documento, que segundo
Sommerman ( 2003) foi aprovadoe passou a ser conhe-
cido como A Síntese do Congresso de Locarno, reside
sobretudo no fato de que nele são propostos três pila-
5 Este documento encontra-se disponível, na integra, sob o título “Congresso Internacional de Locarno – Projeto CIRET-UNESCO [sín-
tese do documento],15p., no site do Centro de Educação Transdisciplinar – CETRANS – http://www.cetrans.com.br
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res metodológicos para a pesquisa transdisciplinar:
1) a “Complexidade”, 2) a “Lógica do Terceiro Incluí-
do” e 3) os “Diferentes Níveis de Realidade”. Isso por-
que, na definição dessa tríade que podemos observar
o que passou a ser considerado, pelos membros do
CIRET e outros pensadores, participantes desses en-
contros internacionais, o “paradigma transdisci-
plinar” capaz de nortear avanços teórico-metodoló-
gicos na produção do conhecimento transdisciplinar,
fato que tem sido observado pela própria contribui-
ção intelectual de Basarab Nicolescu, além de outros
pesquisadores que o adotam como esquema básico de
referência.
Esse documento avançou igualmente ao propor
uma definição para o que considerou três diferentes
níveis de relações disciplinares – pluri, inter e trans-
disciplinaridade –, e o fez de uma maneira que, de al-
gum modo, sintetiza as diferentes acepções dadas
pelos diversos autores, que escreveram sobre cada um
deles, com a exceção do conceito de interdisciplinari-
dade que se apresenta, ainda bastante plural, dada a
própria complexidade que o trabalho interdisciplina-
ridar encerra, pela diversidade de possibilidades e de-
safios epistemológicos presentes, conforme pode ser
observado, nos excertos apresentados a seguir:
“O crescimento sem precedentes dos saberes, em nos-
sa época, torna legítima a questão da adaptação das
mentalidades a esses saberes. O desafio é de grande
porte,pois a contínua expansão dacivilização de tipo
ocidentalparatodooplanetatornariasuaquedaequi-
valente a uma catástrofe planetária de proporções
muito maiores do que as das duas primeiras guerras
mundiais. (...) A necessidade indispensável de víncu-
los entre as diferentes disciplinas se traduz pelo sur-
gimento, na metade do século XX, da pluridiscipli-
naridade e da interdisciplinaridade.”
“A pluridisciplinaridade diz respeito ao estudo de um
objeto de uma única disciplina por diversas discipli-
nas ao mesmo tempo. Por exemplo, um quadro de
Giotto pode ser estudado pelo enfoque da história da
arte cruzado com o da física, da química, da história
das religiões, da história da Europa e da geometria.
Ou a filosofia marxista pode ser estudada pelo enfo-
que da filosofia entrecruzada com a física, a econo-
mia, a psicanálise ou a literatura. O objeto em ques-
tão sairá, assim, enriquecido pelo cruzamento de vá-
riasdisciplinas.O conhecimento doobjeto em sua pró-
pria disciplina é aprofundado por um fecundo aporte
pluridisciplinar. A pesquisa pluridisciplinar enrique-
ce a disciplina em questão (a história da arte ou a fi-
losofia, em nossos exemplos), porém esse enriqueci-
mento está a serviço apenas dessa disciplina. Em ou-
traspalavras,a abordagem pluridisciplinarultrapas-
sa as disciplinas, mas sua finalidade permanece
inscrita no quadro da pesquisa disciplinar.”
“A interdisciplinaridade tem uma ambição diferente da-
quela da pluridisciplinaridade. Ela diz respeito à trans-
ferência dos métodos deuma disciplina à outra.É possí-
vel distinguir três graus de interdisciplinaridade:
a) um grau de aplicação. Por exemplo, os métodos da
física nuclear transferidos à medicina conduzem à
aparição de novos tratamentos de câncer;
b) um grau epistemológico.Por exemplo,a transferência
dos métodos da lógica formal ao campo do direito gera
análises interessantes na epistemologia do direito;
c) um grau de geração de novas disciplinas.Por exem-
plo, a transferência dos métodos da matemática ao
campo da física gerou a física-matemática; da física
departículas à astrofísica,a cosmologia-quântica; da
matemática aos fenômenos meteorológicos ou aos da
bolsa, a teoria do caos; da informática à arte, a arte-
informática.Como a pluridisciplinaridade,a interdis-
ciplinaridade ultrapassa as disciplinas, mas sua fi-
nalidadetambém permaneceinscritanapesquisa dis-
ciplinar. Seu terceiro grau inclusive contribui para o
big-bang disciplinar.”
“A transdisciplinaridade, como o prefixo ‘trans’ o in-
dica, diz respeito ao que está ao mesmo tempo entre
as disciplinas, através das diferentes disciplinas e
além de toda disciplina.Sua finalidade é a compreen-
são do mundo atual,e um dos imperativos para isso é
a unidade do conhecimento.”
Ao colocar como preocupação identificar as especi-
ficidades e níveis de relações entre essas diferentes
modalidades de conhecimento, incluindo o conheci-
mento unidisciplinar que lhe serve de contraponto, a
concepção básica que norteia essa perspectiva que
vem sendo construída por esse grupo para o tratamen-
to da transdisciplinaridade é a de que, embora o tra-
balho transdisciplinar não deva ser confundido com
o das demais, dada a ampla finalidade a que se pro-
põe, todas essas modalidades juntas fazem parte de
um mesmo complexo, o complexo do conhecimento,
22 Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005

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daí se apresentarem, emprestando um termo do pró-
prio Basarab Nicolescu (2001, p.53), como “quatro fle-
chas de um mesmo arco: o do conhecimento”. Por isso
declarar que embora “reconhecendo o caráter radical-
mente distinto da transdisciplinaridade com relação
à disciplinaridade,à pluridisciplinaridade e à interdis-
ciplinaridade, seria muito perigoso considerar essa
distinção como absoluta, pois com isso a transdisci-
plinaridade seria esvaziada de todo o seu conteúdo e
a eficácia de sua ação seria reduzida a nada.”
A preocupação em discutir e caracterizar essas
modalidades de conhecimento decorre dos próprios
desafios teórico-epistemológicos presentes nos três
pilares tomados como “determinantes de uma meto-
dologia da pesquisa transdisciplinar”, assim como da
necessidade de melhor caracterizar seu objeto de tra-
balho. Daí a colocação seguinte:
“A estrutura descontínua dos níveis de Realidade de-
termina a estrutura do espaço transdisciplinar que,
por sua vez, explica porque a pesquisa transdisci-
plinar é radicalmente distintadapesquisa disciplinar,
embora sendo complementar a ela. A pesquisa disci-
plinar diz respeito, no máximo, a um único nível de
Realidade. Na maioria dos casos ela diz respeito aos
fragmentos de um só nível da Realidade. Por outro
lado, a transdisciplinaridade interessa-se pela dinâ-
mica gerada pela ação de diversos níveis de realidade
ao mesmo tempo. A descoberta dessa dinâmica pas-
sa necessariamente pelo conhecimento disciplinar. A
transdisciplinaridade, embora não sendo uma nova
disciplina ou uma nova hiperdisciplina, alimenta-se
da pesquisa disciplinar que, por sua vez, é clareada
de uma maneira nova e fecunda pelo conhecimento
transdisciplinar.Nessesentido,aspesquisas discipli-
nares e transdisciplinares não são antagônicas, mas
complementares. ......como também o são em relação
às pesquisas pluri e interdisciplinares”.
Com base em tais colocações, podemos considerar
que esse congresso de Locarno, de 1997, passa a re-
presentar um marco de referência para esse grupo de
pesquisadores e humanistas que direta ou indireta-
mente participaram de um longo processo deconstru-
ção de um pensamentoparao conhecimentotransdis-
ciplinar. Nesse sentido, a síntese contida em seu do-
cumentofinal, cujas idéias principais foram aqui des-
critas, passa a representar o ponto de partida, a ma-
triz básica de um pensamentotransdisciplinar que se
estrutura a partir dos vários colóquios e congressos
internacionais já mencionados, capaz de representar,
pelo poder heurístico que encerra, uma ampla fertili-
zação cruzada de saberes.
Noentanto, essa proposta, defendida por esse gru-
po de intelectuais, fruto de um entendimento mútuo,
não pode pensar-se única, como puderam constatar
muitos de seus membros por ocasião de um novo en-
contro voltado à discussão do tema. Isso porque, se-
gundo Sommerman (2003), o ano de 2000 marca a
ocorrência de outro grande evento transdisciplinar:
a International Transdisciplinarity Conference:
Transdisciplinarity: Joint Problem-Solving among
Science, Technology and Society, realizada pela Fun-
dação Nacional de Ciência da Suíça e pelo Instituto
Federal de Tecnologia da Suíça, em Zurique, com a
parceria da UNESCO, contando com cerca de 700 par-
ticipantes, de vários países, sendo a grande maioria
desses denacionalidade suíça e alemã. Essa conferên-
cia ganha especificidade e,podemos dizer, autonomia,
por não fazer referência aos eventos interdisciplina-
res e transdisciplinares anteriores, assim como aos
avanços teórico-epistemológicos amplamente docu-
mentados por essas. Ao contrário, colocou seu focode
maneira exclusiva na questão proposta pelo título da
conferência: a resolução de problemas atuais envol-
vendo a participação cruzada daciência, datecnologia
e da sociedade, imprimindo uma perspectiva quase
que puramente pragmática à noção de transdiscipli-
naridade. Ao tomar esse conceito de forma reduzida,
acaba igualmente reduzindo as próprias possibilida-
des de um tratamento adequado do tema da conferên-
cia, considerando a complexidade de que se reveste
as relações entre ciência, tecnologia e sociedade,como
pudemos sinalizar em discussão no início desse tra-
balho. Tal fato gerou, por parte de um grupo de parti-
cipantes, fortereação levando seus membros à formu-
lação de uma declaração intitulada “Uma visão mais
ampla de transdisciplinaridade”
6
, que foi distribuída
aos participantes e anexada, segundo Sommerman
(2003), às atas da Conferência, na qual os signatários
fazem referência ao I Congresso Mundial de Transdis-
6 Este documento encontra-se, sob o mesmo título, como Anexo 4 da coletânea organizada por Sommerman e cols (2002, p.198-202)
Saúde e Sociedade v.14, n.3, p.9-29, set-dez 2005 23

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ciplinaridade, de 1994, e ao Congresso Internacional
de Transdisciplinaridade realizado em Locarno, em
1997, e destacam os pontos principais contidos nos
respectivos documentos finais capazes deenunciar os
pressupostos básicos do pensamento transdisciplinar
que estamos abordando no presente trabalho.
Nesse sentido, tal evento deve ser visto de manei-
ra descolada do processo de avanço do pensamento
transdisciplinar que vimos discorrendo, o qual conti-
nua sua trajetória no II Congresso Mundial de Trans-
disciplinaridade ocorrido no Brasil, Vila Velha/Vitó-
ria (ES), em 2005. Realizado pelo Governo do Estado
do Espírito Santo, pelo CIRET, pelo CETRANS, pela
UniversidadeFederal do Espírito Santoe pelaUnesco,
contou com o apoio, na organização e patrocínio, de
vários institutos, associações, universidades e funda-
ções, além de uma editora. Contou com 370 partici-
pantes, pelo número limitado de vagas, que represen-
taram 17 países, 50 universidades brasileiras e 10 uni-
versidades estrangeiras.
Em seu documento final intitulado“Mensagem de
Vila Velha/Vitória”
7
, reafirma a importância da “Car-
ta da Transdisciplinaridade”, gerada no I Congresso
Mundial da Transdisciplinaridade, enfatizando a ne-
cessidade de “recordar,valorizar, ampliar e contextua-
lizar” os preceitos ali contidos. Nas várias conferên-
cias e palestras programadas, os autores procuraram
aprofundar a discussão em torno dos três pilares de-
finidos no Congresso de Locarno, de 1997, ampliando
a reflexão sobre os mesmos e, em alguns casos, suge-
rindo a introdução de novos pilares.
No registro das “conclusões dos trabalhos” bus-
ca reafirmar a finalidade da transdisciplinaridade
definida nos encontros anteriores e a importância
de sua não institucionalização “como um campo
epistemológico rígido, a fim de preservar sua capa-
cidade deinvestigação aberta, autocrítica”.Cabe des-
tacar a proposição, em uma dessas conclusões, de
que a atitude, a pesquisa e ação transdisciplinar con-
templem a promoção da “saúde individual e coletiva
e o bem-estar do ser humano na sua multidimen-
sionalidade, articulando seus níveis físico, emocio-
nal, mental e espiritual.”
Vale igualmente frisar, dentre as recomendações
presentes no referido documento, a criação de “cáte-
dras transdisciplinares internacionais itinerantes;
universidades transdisciplinares virtuais; programas
universitários de graduação, especialização,mestrado
e doutorado para o estudo da transdisciplinaridade [
assim como] redes virtuais e núcleos de estudo, pes-
quisa e ação transdisciplinares.”
Sobre Emergências e Convergências
de Idéias e Ideais na Construção de
um Pensamento Transdisciplinar
A trajetória percorrida por pensadores de diferentes
áreas do conhecimento em busca de um pensamento
transdisciplinar, por nós apresentada no capítulo an-
terior, permite evidenciar a força de sua emergência
e progressiva estruturação pela identificação de idéi-
as e ideais capazes de convergir, num sentido comum,
e congregar cientistas de diferentes áreas do saber,
filósofos, humanistas, teólogos, poetas, artistas numa
verdadeira ação de resgate do sentido humano e soci-
al de que deve se revestir a produção de todo conheci-
mento, notadamente o científico.
Norteado por uma concepção mais amplade racio-
nalidade, esse movimento relatado se soma aos esfor-
ços empreendidos por muitos pesquisadores, da atu-
alidade, não somente na crítica ao paradigma simpli-
ficado e fragmentador que orienta a ciência discipli-
nar moderna, mas igualmente na busca de novas
formas de conhecimento mais inclusivas.
Tais possibilidades têm sido evidenciadas pelo
avanço que esse pensamento transdisciplinar tem
apresentado a partir do trabalho de alguns pesquisa-
dores que tem tomado, como esquema de referência,
os três pilares e seus pressupostos como norteadores
de suas reflexões, quer no campo da pesquisa, quer
no campo da educação/formação, adquirindo nesse
último peculiaridades.
No propósito de aprofundamento desse pensamen-
totransdisciplinar, destaquecabe aos esforços empre-
endidos por BasarabNicolescu, que desde sua obra“O
Manisfesto da Transdisciplinaridade” (Nicolescu,
2001), publicada na França em 1996, e já considerada
7 O referido documento encontra-se, sob o mesmo título, 8p., no site do Centro de Estudos Transdisciplinares – CETRANS – http://
www.cetrans.com.br
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clássica pelo seu pioneirismo, tem tomado como ob-
jeto de estudoos três pilares da transdisciplinaridade,
definidos no Congresso de Locarno,em 1997,abordan-
do-os em suas especificidades e relações, e como cons-
titutivos de uma metodologia transdisciplinar. Em
seus trabalhos os mesmos são apresentados de ma-
neira ordenada como: “diferentes níveis de realidade”,
“lógica do terceiro incluído” e “complexidade”.
Em trabalhos mais recentes podemos observar
que, em suas reflexões, Basarab Nicolescu passa a
apresenta-los, primeiramente como postulados (Nico-
lescu, 2002) e atualmente como axiomas (Nicolescu,
2005). Neste último trabalho, apresentado no II Con-
gresso Mundial datransdisciplinaridade,realizado no
Brasil, tais axiomas são assim apresentados:
“1- O axioma ontológico: Há, na Natureza e no nosso
conhecimento da Natureza, diferentes níveis de Rea-
lidade
8
e, correspondentes a eles, diferentes níveis de
percepção.
2- O axioma lógico: A passagem de um nível de Reali-
dade a outro se dá pela lógica do terceiro incluído.
3- O axiomadacomplexidade: A estrutura datotalida-
de dos níveis de Realidade ou de percepção é uma es-
trutura complexa: cada nível é o que é porque todos os
níveis existem ao mesmo tempo.” (Nicolescu,2005,p.9)
Vale observar que ao anunciá-los como axiomas a
idéia implícita de Basarab parece ser, por um lado, a
de procurar garantir a manutenção desses três pila-
res como sendo os únicos capazes de seapresentarem
como fundamentais para uma metodologia transdisci-
plinar. Ao referir-se às bases históricas desses três
axiomas menciona que os dois primeiros tiram sua
evidência experimental da física quântica, enquanto
o último tem sua fundamentação não só no campo da
física quântica, mas também em uma variedade de
ciências exatas e humanas. Por outro lado, a idéia im-
plícita de Basarab Nicolescu parece ser a de igualmen-
te apresentar algumas evidências de que muitas das
propostas que emergem, de inclusão de novos pilares,
são, na realidade, derivações desses três, conforme
pode ser observado na seguinte afirmação que faz:
“O caráter axiomático da metodologia da transdisci-
plinaridade é um importante aspecto. Isso significa
que ela tem que limitar o número de axiomas (ou prin-
cípios ou pilares) a um número mínimo.Qualquer axi-
oma que possa ser derivado de algum de seus três
postulados deve ser rejeitado”. (Nicolescu, 2005, p.8)
Muito embora Nicolescu possa demonstrar a for-
ça heurística desses três postulados ou axiomas que
defende como únicos, pelas amplas possibilidades de
avanço teórico-metodológico que seu próprio traba-
lho intelectual tem gerado, das quais seu artigo “Fun-
damentos Metodológicos para o EstudoTranscultural
e Transreligioso” (Nicolescu, 2002) é um bom exem-
plo, vale ressaltar que essa sua posição não é compar-
tilhada por alguns pensadores que lhe são próximos
e inclusive membros do CIRET, como é o caso de Pa-
trick Paul, além de outros.
A posição geral que defendem, e que valeaqui sina-
lizar, é a de que a definição dos pilares, postulados ou
axiomas não precisam se circunscrever necessaria-
mente a um número mínimo, a exemplo dos estabele-
cidos pela física, como argumenta Nicolescu ( 2002,
2005). Esses pesquisadores consideram possível
acrescentar-se um ou mais pilares aos três já defini-
dos, caso se evidenciem necessidades específicas a
dado campo de pesquisa ou a problemas próprios de
determinadas áreas.
Nessa linha de pensamento Amâncio Friaça (2005)
propõe, por exemplo, o conceito de vácuo como um
quarto pilar da transdisciplinaridade. Nessa perspec-
tiva, Patrick Paul (2003) não somente argumenta que
o segundo “axioma”não seesgota com a chamada “ló-
gica do terceiro incluído”, uma vez que na passagem
de cada nível de realidade, para o nível que lhe é con-
tíguo, há uma lógica que lhe é própria, mas, a exem-
plo de Friaça, propõe igualmente um quarto pilar da
transdisciplinaridade, no caso, o “paradoxo” (Paul,
2003; 2005). Também Paulo Roberto Margutti Pinto
(2005, p.160) considera que a “lógica do terceiro in-
cluído” não é a única maneira de se tratar as contra-
dições argumentando que a “lógica contemporânea
oferece inúmeras alternativas não clássicas, como a
adoção de um sistema trivalente, um paraconsistente
ou um impreciso (fuzzy).”
Com isso, esses autores não negam o poder heu-
rístico desses três pilares como importante ponto de
partida parase pensar uma metodologia datransdisci-
8 Vale mencionar que em seus trabalhos Basarab Nicolescu apresenta o termo composto “níveis de Realidade” sempre com “ R” maiúsculo.
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plinaridade, mas procuram se aproximar da posição
bastanteflexíveldefendida pelos signatários da“Car-
ta da Transdisciplinaridade”, de 1994, e fortemente
reiterada na “Mensagem de Vila Velha/Vitória”, de
2005, notadamente em relação ao seu artigo 2 onde
afirma que “O reconhecimento da existência de dife-
rentes níveis de realidade, regidos por lógicas e leis
diferentes,é inerente à atitude transdisciplinar”. Com
isso deixam explícitoque a centralidade na “lógica do
terceiro incluído” representa uma redução do enunci-
ado original do referido pilar decorrente, ao que pare-
ce, da força assumida pelo “documento síntese” ela-
borado com base nos resultados do projeto CIRET-
UNESCO, desenvolvido sob a coordenação de Basarab
Nicolescu, pelo CIRET, e por Madeleine Gobeil, pela
UNESCO, que norteou as discussões e que foi adota-
do e aprovado como documento final do Congresso de
Locarno, de 1997,conforme descrevemos anteriormen-
te. A flexibilização daCarta daTransdisciplinaridade,
de 1994, pode ser igualmente observada quando se
considera que neste último congresso de 1997, foi in-
troduzido um terceiro pilar, “a complexidade”, apon-
tando para a grande abertura a que se propunham os
signatários da mesma.
Tal tipo de discussão, que poderia ser amplamente
desdobrada, mas foge ao âmbito desse trabalho, per-
mite-nos, no entanto, nos limites do presente texto,
colocar como relevante a indagação acerca do que po-
deria, de fato, significar, para partidários dessa nova
proposta de um pensar transdisciplinar, a adoção da
“complexidade”, dos “níveis de realidade” e da “ lógi-
ca do terceiro incluído”, como ponto de partida para
suas reflexões? Consistiria, essa nova proposta, nos
germes de um novo “paradigma”, na acepção de Kuhn
(1975), anteriormente descrita por nós para caracteri-
zar o paradigma simplificado que norteia o modelo
de pesquisa, de “ciência normal”, que caracteriza a
produção da ciência moderna e que deve ser necessa-
riamente ser compartilhado pela comunidade cientí-
fica, ou, consistiria, então, em uma “matriz transdis-
ciplinar”? Esta, para utilizarmos uma adaptação ao
conceito de “matriz disciplinar” que Kuhn (1978) de-
senvolve no sentido de responder as críticas que rece-
beu, pela ambigüidade que o termo ‘paradigma’ apre-
senta em sua obra “A estrutura das revoluções cientí-
ficas” (Kuhn, 1975), pelas várias definições explícitas,
ou por vezes implícitas, que emprega.
Dessa primeira aproximação à análise de conteú-
do do conjuntodos documentos firmados nos diferen-
tes encontros internacionais, que tomou a transdis-
ciplinaridade como tema, parece-nos que, muito em-
bora o termo ‘paradigma’ seja empregado por muitos
autores partidários desse pensamento, na maioria dos
casos a presença do termo representa tão somente
uma simples menção, ou ainda assume um outro sen-
tido usualmente não explicitado, como, por exemplo,
o do conceito de “modelo” ou de “teoria”. Assim, seu
significado “real” permanece ambíguo e mesmo vago,
na maioria dos casos, sugerindo outros sentidos que
aqueles atribuídos por Kuhn, em seus trabalhos. No
entanto, tal indagação parece-nos instigante na abor-
dagem do significado dessa proposta de um pensa-
mento transdisciplinar, para seus membros, pela fre-
qüência com que o termo é referido.
Se tomarmos a interessante análise comparativa
e crítica que Kneller (1980) faz das propostas de Karl
Popper, Thomaz S. Kuhn, Imre Lakatos, Paul Feyera-
bend, Nicholas Maxwell e Gary Gutting para explicar
diferentes perspectivas na abordagem da história das
ciências, assim como suas possibilidades e limites,
podemos supor, numa primeira reflexão sobre a ques-
tão, que a proposição dos referidos pilares, como fun-
damentais para uma metodologia transdisciplinar, se
aproximaria, dentre os autores mencionados por
Kneller, muito mais das concepções de “programa de
pesquisa”,deLakatos, ou de“esquemabásico”deMax-
well, por exemplo, do que da concepção clássica de
“paradigma”ou de “matriz disciplinar” de Kuhn, dada
a maior flexibilização que as caracterizam.
Muito embora possa parecer precoce considerar o
movimento, engendrado por esse grupo diferenciado
de pensadores, na direção da definição de um novo
pensamento, como passível de estar inscrito em uma
novahistória da ciência moderna, a hipótese presente
é a de que esse movimento, como bem o descreve Ba-
sarabNicolescu (2005) em sua apresentação no II Con-
gresso Mundial de Transdisciplinaridade em Vila Ve-
lha/Vitória, no texto intitulado “Transdisciplinari-
dade – Passado, presente e futuro”, permite enunciar
que a busca por um pensamento transdisciplinar já
tem sua própria história.
As perspectivas futuras para o avanço desse e de
outros pensamentos transdisciplinares similares, que
possam emergir enriquecendo essa história são, ao
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que parece, amplas, considerando que, independente-
mente da diferença de perspectivas teóricas, a busca
de articulação do campo científico com outros ramos
do conhecimento, como, por exemplo, o da filosofia,
das humanidades, da arte, da literatura, ganhará ex-
pressão num contexto onde os novos traços que ca-
racterizam o conhecimento são designados, segundo
Paul(2003, p.134), como “complexidade,hibridez, não
linearidade, reflexividade, heterogeneidade e trans-
disciplinaridade”.
E nesse processo de avanço que áreas como a saú-
de, sobretudo em sua dimensão coletiva e pública, po-
dem se beneficiar de maneira substantiva.
Isso tendo em vista, por um lado, que a despeito
desta ser considerada, na reflexão de muitos pesqui-
sadores, como campo caracteristicamente interdisci-
plinar (Minayo, 1991, 1994; Alvarenga, 1994; Gomes e
Deslandes, 1994, Nunes, 1995), a questão do reducio-
nismo e fragmentação do conhecimento encontra-se
presentee coloca-se como grande desafio a ser enfren-
tado, dada a predominância do modelo biomédico que
norteia suas práticas (Ayres, 1994, 1995, 1997: Almei-
da Filho, 1989, 1992; Castiel, 1994). Por outro lado, pela
constatação de que novas possibilidades de abertura
seapresentam ao campo, a partir de trabalhos que pro-
curam contribuir para a emergência de novas formas
de pensar a saúde em sua complexidade, dentre os
quais ganha relevo alguns com propostas de metodo-
logias transdisciplinares, como é o caso das formula-
das por Naomar de Almeida Filho (1997), Mário Cha-
ves (1998) e Juan Samaja (2004).
È nesse contexto que consideramos que as refle-
xões sobre transdisciplinaridade desenvolvidas por
esse grupo de pensadores de diferentes formações, ao
longo dos vários congressos internacionais que ver-
saram sobre o tema, voltadas para a identificação dos
fundamentos de uma metodologia transdisciplinar,
aqui analisadas, possam vir a se somar aos esforços
empreendidos na área, quer no campo da pesquisa,
quer no campo da educação e da formação em saúde.
Uma pequena menção em relação à contribuição
de alguns autores, no campo da educação, a partir
dessa concepção de transdisciplinaridade aqui esbo-
çada, permite apontar igualmente para a capacidade
heurística desse esquema básico de referência e o
avanço que pode representar sua incorporação naárea
da educação/formação em saúde.Nesse sentido ganha
destaque contribuições específicas de autores como
Gaston Pineau, Pascal Galvani e Patrick Paul, que
buscam articular essa perspectivade transdisciplina-
ridade com a teoria tripolar da formação proposta por
Gaston Pineau , designada como auto, hetero e ecofor-
mação e concebida como uma ferramenta pedagógica
para uma educação/formação transdisciplinar. Tais
contribuições podem ser observadas, em seu conjunto,
em recente compilação sobre o tema, em coletânea
intitulada “Transdisciplinaridade e formação”, organi-
zada por Paul e Pineau (2005).Referência cabe igual-
mente a trabalho de Galvani (2000), intitulado “A
autoformação: uma perspectiva transpessoal trans-
disciplinar e transcultural, onde abordaas questões da
transculturalidade com vistas ao aprofundamento das
concepções de autoformação e ontoformação. Do mes-
mo modo vale mencionar que em seus últimos traba-
lhos, Pineau sepropõe ao desafio teórico- metodológico
debuscar articular a transdisciplinaridade,a teoria tri-
polar da formação, a pesquisa formação-ação e a meto-
dologia das histórias devida, cuja experiência é relata-
da em artigo recentemente publicado. (Pineau, 2004)
Finalizando, parece-nos importante considerar
que notadamente para o campo da saúde pública e
coletiva, independentemente das perspectivas teóri-
co-metodológicas que seus pesquisadores adotem,
quer na área da pesquisa, quer na área da educação/
formação, assumir em seus trabalhos uma “atitude”
pluri, inter ou transdisciplinar, que se aproxime de
uma reflexão crítica frente ao paradigma da simplifi-
cação e da fragmentação que nela opera, passa a re-
presentar um avanço. Isso por entendermos que a ado-
ção de um novo olhar, nessa área caracteristicamen-
te pluri, inter e transdisciplinar, possa abrir perspec-
tivas para caminharmos na direção de uma
‘linguagem científica’ mais ampla, que se aproxime
cada vez mais e mais da natureza e da complexidade
de que se reveste nosso objeto de trabalho.
E oxalá essa nova “atitude” possa ser incorpora-
da, a partir de um novo tipo de formação, igualmente
pelos profissionais da área biomédica, o que certa-
mentereorientaria, retomando a preocupação de Paul
(2003) colocada em nível da introdução desse traba-
lho, o avanço do conhecimento científico numa nova
direção, no sentido de construção de uma nova ciên-
cia moderna que coloque os benefícios de seu conhe-
cimento realmente a serviço do homem.
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Recebido em: 10/10/2005
Aprovado em: 08/11/2005